O Caderno das constelações


O caminho para o trabalho era longo, pontuado por madrugadas frias e paragens de autocarro ainda meio adormecidas. Com o tempo, comecei a reconhecer os rostos que, tal como eu, faziam aquela travessia diária. Era como um pequeno teatro silencioso onde cada um tinha o seu papel: a senhora com a sua característica tote bag e kispo cor-de-rosa, o rapaz que adormecia sempre ao fim de duas paragens, a jovem com cabelo vermelho que lia romances policiais. As nossas rotinas cruzavam-se todos os dias à mesma hora, no mesmo lugar.

Foi numa dessas manhãs em que o nevoeiro pairava rente ao chão que reparei nele pela primeira vez. Um rapaz, talvez da minha idade, que entrava no autocarro três paragens depois da minha. Alto, de feições calmas, olhos sempre atentos, mas discretos. Sentava-se sempre no mesmo lugar, junto à janela, a meio do autocarro. Mas o que mais me chamou a atenção não foi ele, foi o caderno que trazia consigo.

Não era um caderno qualquer, este parecia saído de outra época: tinha a capa dura em tons de azul escuro, com um mapa do sistema solar desenhado na mesma, onde dava para ver as constelações e os planetas na sua órbita.

Enquanto os outros se afundavam nos ecrãs dos telemóveis ou se desligavam do mundo com os auscultadores, ele abria o caderno e escrevia. Escrevia com intensidade, como se cada palavra lhe saísse sem esforço. Nunca espreitei por cima do ombro, mas a curiosidade foi crescendo, dia após dia. O que escreveria ele com tanto afinco? Poesia? Cartas? Pensamentos soltos?

Todos os dias eu observava-o discretamente, imerso no seu mundo. Até que, certo dia, algo mudou. Ele entrou no autocarro, sentou-se, mas não abriu o caderno. Ficou simplesmente a olhar pela janela, como se procurasse respostas no movimento dos carros ou no bailado das árvores pelo vidro. No dia seguinte, o mesmo. E no outro também.

O vazio que deixou ao não escrever tornou-se insuportável para mim. A inquietação cresceu até não caber mais dentro de mim. Numa manhã de coragem súbita, quando ele entrou e, como era agora habitual, se deixou ficar calado a olhar a paisagem, levantei-me do meu lugar e fui sentar-me ao lado dele:

“Desculpa…”, disse com a voz trémula, “não sei se já reparaste, mas apanhamos o mesmo autocarro todos os dias e… não consegui evitar reparar que costumas escrever num caderno. Um caderno muito bonito, por sinal. Mas ultimamente… deixaste de o fazer. Está tudo bem? Espero não estar a ser intrometida… só fiquei curiosa.”

Ele olhou para mim, primeiro com surpresa, depois com um sorriso tímido. A sua voz era suave, mas firme:

“Não, não estás a ser intrometida. É só que… estou a acabar o curso em Línguas e Literaturas e, para pagar as contas, trabalho num supermercado. O tempo para escrever tem sido cada vez mais escasso, por isso, aproveitava estas viagens para escrever poesia, pensamentos, às vezes até ideias para histórias. Na semana passada, falei com uma professora sobre um concurso literário e acabei por lhe mostrar o caderno. Ela gostou tanto que o quis levar para o ler com calma e ver se há textos que possa submeter. Foi como entregar um pedaço de mim. Agora sinto-me… estranho, sem ele.”

“Se ela te devolver o caderno… gostava muito de o ler”, disse-lhe, com sinceridade

Ele sorriu. “Está prometido.”

A partir desse dia, começou a sentar-se sempre ao meu lado. As conversas surgiram naturalmente, como se já estivéssemos destinados a tê-las. Falávamos de livros, de música, de sonhos e da vida em geral. Finalmente, numa manhã solarenga, ele entrou no autocarro com o caderno nas mãos:

“Ela devolveu-mo ontem”, disse, estendendo-mo. “Lê quando puderes e diz-me se tem potencial.”

Passei o resto do dia a devorar cada página. As palavras que ali estavam tinham alma. Eram poemas que pareciam feitos de luz e sombra, reflexões sobre o tempo, sobre o silêncio, sobre o que é ser jovem num mundo que não pára. Era belo, autêntico, comovente.

No dia seguinte, sentei-me ao lado dele com o coração acelerado. Antes que pudesse perguntar, disse-lhe:

“Se tem potencial? Tem mais do que isso. Mas achas que te posso dar o meu feedback noutro ambiente… mais acolhedor? Um café, talvez? Ou um jardim?”

Ele sorriu, como quem já esperava aquele convite.

E foi assim que começou. Não uma história de amor, necessariamente — embora talvez também isso —, mas, acima de tudo, o início de uma amizade verdadeira, feita de palavras, de constelações e de viagens partilhadas no silêncio cúmplice de um autocarro.


Cadernos Cavallini

Os cadernos da Cavallini combinam na perfeição funcionalidade e design vintage, resultando em peças que encantam à primeira vista. Disponíveis em vários formatos – do prático A5 aos charmosos mini cadernos –, cada modelo é ilustrado com imagens únicas do nosso arquivo, conferindo-lhes um estilo inconfundível. Ideais para anotar ideias, fazer listas ou desenhar, são pensados para quem valoriza qualidade, personalidade e bom gosto em cada detalhe.

Os mini cadernos Cavallini vêm em conjuntos de três, oferecendo versatilidade e variedade num só pack. Cada conjunto inclui um caderno pautado, um liso e um quadriculado, adaptando-se a diferentes tipos de uso — desde apontamentos rápidos a esboços criativos. Com 96 páginas cada, são leves, compactos e perfeitos para acompanhar o ritmo do dia a dia, sempre com um toque vintage à mão.

Já os cadernos com elástico da Cavallini destacam-se pela sua capa dura resistente e acabamento refinado. Com 144 páginas pautadas de papel de alta qualidade, contam ainda com um bolso interior traseiro, ideal para guardar notas soltas, cartões ou lembranças. O fecho com elástico assegura proteção extra, enquanto o design clássico com ilustrações vintage transforma cada caderno numa peça única e elegante.


18 de junho de 2025
Estava sozinho na sala, de joelhos no tapete, com o coração quente e um sorriso que não me largava o rosto. Tinha acabado de abrir o presente que me deram pelo aniversário: um poster vintage com ilustrações de dinossauros. Daqueles à moda antiga, com nomes científicos e poses majestosas. Era bonito — não só esteticamente, mas porque me trazia de volta a um tempo que parecia distante, quando eu próprio era criança e vivia obcecado com estes gigantes do passado.
11 de junho de 2025
Entrei pela porta da frente, e logo o fresco do interior me envolveu. Fui direta à estante baixa junto à lareira. E lá estava ele, de onde nunca saiu: o tubo do puzzle.
4 de junho de 2025
Coloquei o meu avental, gasto, mas cheio de história, aquele que me acompanha desde que comecei a aprender a cozinhar, e que carrega as marcas de tantas receitas e momentos felizes.
28 de maio de 2025
Colei a nota aderente com cuidado dentro do meu livro favorito na altura: A Sombra do Vento, do Zafón. Um livro que já tinha lido três vezes e que sabia que não ia reler tão cedo. Foi o esconderijo perfeito. E assim passou o tempo.
21 de maio de 2025
Comprei também um conjunto de lápis, todo decorado com padrões florais, era como se cada lápis tivesse a sua própria personalidade. Dei um lápis a cada amigo e pedi-lhes para escreverem no papel uma mensagem para ela: algo bonito, algo sentido. E escreveram. Coisas mesmo sinceras.
14 de maio de 2025
Toquei à campainha, mas ninguém abriu. Pensei que já não vivesses lá. Fiquei lá parado uns minutos sem saber o que fazer, e lembrei-me do postal. Comprei um set de papelaria numa loja pequenina no sul de França, e escolhi este postal porque me fez lembrar de ti, os gatos, o estilo antigo...
7 de maio de 2025
Era antiga, de algodão, com um padrão floral que cheirava a primavera. Tinha pertencido à minha avó e, quando ma deu, disse-me: “Para que nunca te esqueças que as coisas simples são as mais bonitas.”
30 de abril de 2025
Já instalada na minha nova vida italiana, um dia estava a passear pelas ruelas do centro quando vi uma pequena loja de artigos vintage e entrei sem pensar. Lá dentro, numa prateleira de madeira envelhecida, vi um mini puzzle com uma ilustração vintage de várias borboletas.
23 de abril de 2025
Havia algo especial nela, dentro da sua mala, havia sempre uma bolsa, mas não uma qualquer, era vintage, de tecido encorpado, coberto por flores em tons antigos, como se tivesse sido arrancado de uma ilustração botânica de uma enciclopédia esquecida no sótão de uma casa senhorial.
16 de abril de 2025
Lá no fundo, vi a minha tote bag preferida, aquela que usava quando saía sozinha, antes de me moldar para agradar aos outros. Peguei nela, coloquei lá um livro que andava a adiar ler há meses, um caderno e uma caneta, os meus fones, toalha, protetor solar e alguma comida e fui até à praia.
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